Um é pouco, dois é bom. Oito meses depois de vermos uma cerimônia do Primetime Emmy Awards, a Academia de Artes e Ciências Televisivas dos Estados Unidos realiza, neste domingo (15), mais uma festa para celebrar os melhores na televisão e no streaming.
As duas cerimônias num único ano são resultado da greve de atores e roteiristas que tomou Hollywood, empurrando a premiação de 2023 para 2024. Agora, os rostos mais badalados das telinhas americanas retornam ao Teatro Peacock, em Los Angeles, a partir das 21h de Brasília, para uma nova entrega de troféus –muito diferente da anterior, porém.
Mesmo com um curto espaço de tempo entre a 75ª e a 76ª edição, a festa deste domingo tem outra cara. Sem as badaladas “Succession”, “The Last of Us”, “Better Call Saul” ou “The White Lotus” no páreo, é a comédia que brilha agora, em meio a indicações dramáticas, historicamente consideradas mais nobres, que não causaram muita comoção desta vez.
Cada vez maiores e mais ambiciosas, as séries dramáticas demoram a sair da sala de pós-produção e, consequentemente, a ter novas temporadas lançadas. Gigantes como “A Casa do Dragão“, “Stranger Things” e “O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder” não conseguiram entregar episódios novos a tempo desta edição, por exemplo.
No entanto, como mais indicado da noite, ainda temos um drama. A novata “Xógum: A Gloriosa Saga do Japão” saiu na frente, com 25 menções, acompanhada de perto pelas 23 de “O Urso”, que encabeça as comédias –é um recorde dentro do gênero, numa evidência da atenção dada a esta ala e também à natureza incerta desta produção.
Não é segredo para a indústria que “O Urso” é mais drama que comédia. Mas como são os estúdios que definem em que categorias submetem suas produções, a Disney percebeu que a trama de meia hora por episódio, ambientada dentro de uma cozinha e sem grandes firulas, poderia ser ofuscada pela ação épica de “Xógum”, as intrigas palacianas de “The Crown” ou os efeitos especiais de “Fallout“.
É irônico que “O Urso” agora seja a grande queridinha deste Emmy, porque seria fácil imaginá-la triunfando nas categorias dramáticas deste ano –fato que provavelmente não ocorreria em sua temporada anterior, pela qual venceu como melhor comédia.
Além de “Xógum”, “O Urso” poderia ter “The Crown”, “Fallout”, “A Idade Dourada”, “The Morning Show”, “Sr. & Sra. Smith”, “Slow Horses” e “O Problema dos 3 Corpos” como competidoras se ficasse em drama. Mas enfrenta, nesta noite, as comédias “Abbott Elementary”, “Hacks”, “Segura a Onda”, “Only Murders in the Building”, “Reservation Dogs”, “Palm Royale” e “O que Fazemos nas Sombras”.
“O Urso” pode até merecer uma enxurrada de láureas, mas quando isto acontece às custas de séries que se mantém fiéis ao gênero que batiza a categoria de melhor série de comédia, a jornada de campeã perde a graça e vira estratégia de marketing pouco honesta.
Disputadíssimo na atual era de plataformas de streaming –chefiadas por algoritmos que as mandam investir mais no formato serializado e menos em longas-metragens–, o troféu de melhor minissérie tem entre seus pretendentes “Bebê Rena”, “Ripley”, “Fargo”, “Uma Questão de Química” e “True Detective: Terra Noturna”, que lidera com 19 indicações.
Como em comédia a vitória parece fácil para “O Urso” e com drama ninguém parece se importar muito, as minisséries acabaram por formar a corrida mais emocionante deste Emmy, uma coleção que traz variedade, altíssimo valor de produção e muito primor.
Já a comumente insossa guerra entre filmes para a TV tem entre seus combatentes um leque de produções que ninguém parece ter realmente visto, com “A Grande Entrevista”, “O Último Caso do Sr. Monk”, “Quiz Lady”, “A Batalha do Biscoito Pop-Tart” e a exceção “Vermelho, Branco e Sangue Azul”, romance gay que viralizou, mas inofensivo demais para o Emmy.
Não é ruim que esta edição do prêmio esteja com a cara diferente, porém. É saudável para a indústria uma pulverização de indicações, desta vez menos concentradas em Netflix e HBO –com 107 e 91, respectivamente, enquanto a FX, da Disney, abocanhou 93, e o Apple TV+, 70.
A presença de “Xógum” no topo da lista é ainda um bom indicativo de que o público quer histórias mais diversas, olhares que extrapolam o do americano. Mesmo sendo produzida nos Estados Unidos, a série conta a história dos samurais no Japão, tem a maior parte dos diálogos no idioma da ilha asiática e foge do lugar-comum com o qual o espectador está habituado.
Este é um Emmy, portanto, para reflexão –da premiação sobre ela mesma, e do espectador em relação ao que quer ver na telinha.